segunda-feira, 19 de fevereiro de 2007

Poesias da Semana

O RIO CAI

O rio cai.
Ainda,
e ainda.

O rés do caminho anda,
água à frente,
chão pra trás.

Nem ida nem vinda,
a vida do rio,
perdura invés.



UMA ARTE

A arte de perder não é nenhum mistério;
tantas coisas contêm em si
o acidente de perdê-las,
que perder não é nada sério.

Perca um pouquinho a cada dia. Aceite, austero,
a chave perdida, a hora gasta bestamente.
A arte de perder não é nenhum mistério.

Depois perca mais rápido, com mais critério:
lugares, nomes, a escala subseqüente
da viagem não feita. Nada disso é sério.

Perdi o relógio de mamãe. Ah! E nem quero
lembrar a perda de três casas excelentes.
A arte de perder não é nenhum mistério.

Perdi duas cidades lindas. E um império
que era meu, dois rios, e mais um continente.
Tenho saudade deles. Mas não é nada sério.

– Mesmo perder você (a voz, o riso etéreo
que eu amo) não muda nada. Pois é evidente
que a arte de perder não chega a ser mistério
por muito que pareça (Escreva!) muito sério.


Elizabeth Bishop
Versão em português: Paulo Henriques Brito

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